segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A importância do ombudsman – o caso de Vera Giangrande

“O empresário que ouvir os seus clientes tem muito mais chance de prosperar e realizar lucro entre àqueles que não os ouve.”
(Vera Giangrande)

Em setembro de 1948, o português Valentim dos Santos Diniz abriu uma doceira na Brigadeiro Luiz Antônio e a nomeou homenageando sua segunda pátria se utilizando do conhecido nome de um ponto turístico carioca – Doceira Pão de Açúcar. Com vinte anos de estrada, a rede compreendia 64 supermercados. A família Diniz sonhou alto: ser a maior cadeia de varejo no Brasil. Até 1987, o grupo Pão de Açúcar não via ninguém à sua frente, quando perdeu o primeiro lugar do ranking para o Carrefour. A partir daí, começaram a perder dinheiro, liquidez e o foco estabelecido por seu Santos, como era conhecido. Abílio dos Santos Diniz, o filho mais velho, foi o porta voz do grupo e assumiu: “o pecado capital do Pão de Açúcar foi querer ser o maior, e não o melhor”. Este passou então a ser o novo sonho – ser o melhor. Começa uma das mais surpreendentes viradas da história do varejo brasileiro.

Ana Maria Diniz, filha de Abílio Diniz, diretora de marketing, queria alguém com imagem pública acima de qualquer suspeita para exercer um papel fundamental nos novos moldes de negócios do grupo como forma estratégica da ressurreição. Este profissional coordenaria um departamento de mediação da relação empresa-consumidor. Seria tendencioso, tenderia sempre a favor do cliente, não estaria abaixo de ninguém no organograma da empresa e teria livre acesso à sala de Abílio Diniz. O novo cargo possuía nome de origem sueca: ombudsman. O primeiro ombudsman que se tem notícia no mundo surgiu em 1809 no Parlamento da Suécia e representava o povo junto ao governo, fornecendo instrumentos ao parlamento para fiscalizar juízes e servidores.

Ana Maria já tinha ouvido falar de Vera Giangrande por meio de amigos empresários e do consultor de varejo do grupo. O que se ouvia era que Vera era uma pessoa de bom senso, equilibrada e hábil ao lidar com o público. As recomendações foram as melhores e Vera aceitou marcar uma reunião com a diretoria do grupo. Foi quando Abílio e Ana Maria Diniz perceberam um alinhamento entre o pensamento de Vera e o que eles queriam para a empresa. Era a ombudsman que haviam idealizado. No contrato, estipulava-se que ombudsman tem o princípio fundamental da independência moral e ética com relação à contratante para evitar que se prejudique o objetivo final – agir como defensor do cliente e da contratante.

Suas funções começavam no relacionamento direto com os clientes. Um dia, uma cliente estava em uma das lojas e, na fila do caixa, encostou em uma parede recém pintada com seu caríssimo casaco argentino de pelica. O problema é que não havia qualquer forma de aviso ou alerta sobre a tinta fresca. A cliente, quando percebeu, esbravejou algumas palavras e se direcionou a uma delegacia para registrar queixa. Quando Vera Giangrande ficou sabendo, lamentou não ter sido acionada antes e ligou imediatamente para a cliente propondo uma visita à lavanderia. O gerente da loja onde ocorreu o incidente acompanhou a cliente a mais de uma lavanderia, procurando uma que garantisse o melhor resultado. Além disso, levou o casaco a uma confecção especializada para encomendar uma réplica. Em pouco tempo, os casacos (o novo e o restaurado) ficaram prontos e foram ambos aprovados pela cliente.

Porém, sua missão como ombudsman não acabava por aí. Além desse tipo de ação, Vera visitava regularmente, quase sempre sem aviso, as lojas observando condições de higiene, limpeza, qualidade dos produtos, iluminação do ambiente e desempenho dos funcionários. Outra função era trazer a voz do cliente para dentro da empresa. Fazia relatórios à diretoria, às lojas, ao departamento de Recursos Humanos e à tesouraria incluindo um balanço das manifestações recebidas.

O cargo de ombudsman caiu muito bem à Vera Giangrande e o contrato foi por muitos e muitos anos renovado. No lugar e na hora certa, ela foi a peça-chave no reposicionamento de mercado do grupo.
Por Mariana Gutierre


Fonte: Na trilha da excelência: Vida de Vera Giangrande – uma lição de relações públicas e encantamento de clientes. Alexandre Volpi – Negócio Editora.

3 comentários:

  1. Muito bom. Esses dias fui numa palestra de JOsé Galló, CEO das lojas Renner. Ele diz que nas lojas todos são ombudsman, claro, respeitando a hierarquia, assim, é o gerente o ombudsman de cada loja. Ele conta uma história que na década de 90 um senhor deixou um black tie para ser ajustado e nunca mais foi buscar, depois de 10 anos ele chegou com a guia para buscar o traje, só que não estava mais la e fazia muito tempo que a Renner naõ trabalhava com black tie. Mas o cliente estava correto, deixou lá e foi buscar. Entao o gerente neste meio tempo pensou, 'o que fazer?' E ele foi na concorrente, comprou um traje do tamanho do cliente e mandou entregar em casa. José Galló diz que nem foi consultado na época sobre isso, mas que ficou orgulhoso de um gerente seu ter tido esta atitude. É o que ele chama de encantometro, ele diz que foi com este pensamento que a Renner conseguiu abrir mais de 100 lojas em 20 anos no Brasil: encantando o cliente

    MATEUS

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  2. Com certeza, Mateus! O foco no cliente é sempre uma boa entre as organizações. O atendimento diferenciado faz toda a diferença e qualquer um de nós pode dizer isso: quantas vezes já não fidelizamos com uma loja, por exemplo, pelo atendimento?
    Todos são suscetíveis à problemas, mas saber como resolvê-lo e de modo satisfatório para o cliente é fundamental.
    Obrigada pelo comentário!

    Abraços,
    Mariana

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  3. Já conhecia esta estória através de palestra na Fundação Getúlio Vargas e, agora que estou empenhado em levar melhoria de qualidade na relação cliente/fornecedor, estou me aprofundando no assunto, pois acho que inclusive as órgãos públicos (alguns já têm), devem manter esta relação, pois o grande problema é que "quando as coisas chegam lá em cima, chegam sempre bem" e os administradores e/ou os que têm poder de decisão não ficam sabendo nada.
    Amorim - www.panocity.com.br

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